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Lesões por Esforços Repetitivos: Um risco ocupacional do Cirurgião-Dentista
NADER,
H. A. ; MARZIALE, M. H. P.#
# Profa. Dra. da EERP-USP
Introdução
As Lesões por Esforços Repetitivos (LER),
atualmente denominadas Doenças Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho (DORT),
tem merecido atenção especial, inclusive na odontologia, em virtude do
acometimento cada vez maior de profissionais, obrigando-os ao afastamento
temporário de suas atividades laborais, em virtude do comprometimento das
articulações dos dedos, pulso, cotovelo e ombro14.
O desconhecimento, e a negligência de uma
prática de prevenção às LER, podem causar graves danos à saúde do profissional,
tendo conseqüências diretas no exercício do trabalho, como a diminuição da
produtividade, e em casos extremos, podendo promover a saída precoce do
trabalhador do mercado de trabalho.
O presente artigo tem a finalidade de
apresentar, de forma suscinta, aspectos relacionados às LER, e principalmente a
de conscientizar o profissional da necessidade de atitudes preventivas, visando
principalmente a manutenção da qualidade de vida.
Definição
As LER são um fenômeno
relacionado ao trabalho, provocadas pelo uso inadequado e excessivo do sistema
que agrupa ossos, nervos, músculos e tendões. Típicas do trabalho intenso e
repetitivo, as LER são causadas por diversos tipos de pressão existentes no
trabalho, que afetam as pessoas, tanto física quanto psicologicamente ( FUNDACENTRO4,
2003 ).
Lesões por traumas
cumulativos, distúrbios cervicobraquiais ocupacionais, síndrome ocupacional do
“overuse”, são termos utilizados como sinônimos de LER, que atualmente recebe a
denominação oficial de Doença Osteomuscular Relacionada ao Trabalho ( DORT
); entretanto, por ser um termo mais conhecido, optamos por utilizar
neste artigo a nomenclatura LER.
Formas clínicas
As LER abrangem diversas
patologias, sendo que as mais conhecidas são: Tenossinovite, Bursite,
Tendinite, Cervicobraquialgia, Epicondilite, Síndrome do Túnel do Carpo,
Síndrome do Túnel Ulnar e Síndrome do Redondo Pronador.
Embora atinjam
principalmente os membros superiores: Mãos, Punhos, Braços, Antebraços, Mãos e
Coluna Cervical, as LER podem afetar o ser humano como um todo4.
Fatores de Risco
De uma maneira geral, são
vários os fatores existentes no trabalho, que podem concorrer para a ocorrência
de LER.
O principal, seria o
desrespeito aos fatores ergonômicos e antropométricos6, além de
repetitividade de movimentos, manutenção de posturas inadequadas por tempo
prolongado, esforço físico, invariabilidade de tarefas, pressão mecânica sobre
determinados segmentos, trabalho muscular estático, vibração e frio1.
Sintomatologia
As ocorrências dos
sintomas, concomitantes ou não, varia de acordo com o estágio em que se
encontram as LER3. Comumente o profissional apresenta dor,
parestesia, edema, sensação de peso, fadiga de aparecimento insidioso,
geralmente no membros superiores e perda da força muscular1,2.
A conjunção destes fatores, somados aos aspectos
psicossomáticos, fazem com que a vida pessoal e profissional seja afetada.
É muito comum a queda da
perfomance profissional no trabalho12,14, por vezes causando o
afastamento temporário das atividades laborais.
Tratamento
É consenso entre os
especialistas, que quanto mais precoce o início do tratamento, tanto mais
favorável será o prognóstico.
A variedade de tratamentos
é ampla e abrange desde uma simples imobilização com terapia antiinflamatória e
fisioterapia, até a realização de cirurgia1,3,10,11.
Para CUNHA3 (
1988 ), basicamente o tratamento resume-se em quatro pontos importantes:
Medidas gerais
Que seria a recomendação de
repouso e dieta, reduzindo a atividade nas articulações afetadas, favorecendo a
possibilidade de restabelecimento do profissional.
Medidas terapêuticas
Basicamente tem o intuito
de alívio da dor e diminuição do processo inflamatório, com o uso de
analgésicos, antiflogísticos e relaxantes musculares.
Medidas ortopédicas
Indicação apenas para a
correção de postura, deformidades ou anormalidades que venham à ocorrer.
Medidas cirúrgicas
Somente em alguns casos,
quando a intervenção cirúrgica é a única medida capaz de restituir a capacidade
funcional e diminuir a dor.
Cabe ressaltar que, em
virtude da polêmica existente sobre o tema LER, ainda hoje, não encontramos nos
serviços de saúde, uma visão e estruturas interdisciplinares com um referencial
teórico-metodológico de abordagem, levando muitos pacientes à procura de
prática “não convencionais” como
acupuntura, homeopatia, fitoterapia, além de ginástica laboral , Do-in e
shiatsu1.
LER e a Odontologia
A odontologia envolve na sua prática,
atividades repetitivas, excesso do uso de força nas mãos, esforço para
manutenção de posturas antinaturais, sobrecarga dos membros superiores em
oposição a uma imobilidade relativa dos membros inferiores, além de outros
fatores que podem propiciar o aparecimento das LER8,10,14
Ainda, segundo GREEN, BRAUN5 (1963), os cirurgiões dentistas apresentam a seguinte problemática:
-sentam ou permanecem em pé durante longos períodos de tempo
-abaixam excessivamente a cabeça
-freqüentemente mantêm os cotovelos a uma altura acima do ombro
-o mau posicionamento da mesa auxiliar obriga-os a estender o braço
e a mão para alcançar os
objetos de trabalho
-mantêm acentuada lordose cervical e dorsal
-quando trabalham em pé, tendem a se apoiar quase sempre no mesmo
membro inferior e, quando sentados, posicionam-se na beirada dos bancos, não
havendo apóio da coluna dorso-lombar.
Então, estes fatores,
somados ao baixo gasto energético, a falta de oportunidade para pausas de
repouso satisfatórias, a imobilidade relativa e o uso de grandes grupos de
músculos para manter a posição de trabalho, podem causar a tecnopatias
odontológicas, como a LER.
A Ergonomia e a prevenção
de LER
No decorrer dos anos, houve
um notório desenvolvimento nas práticas de atendimento odontológico promovido
pela ergonomia, possibilitando que o profissional, que no passado ficava todo o
seu tempo atendendo em pé (posição ortostática), pudesse se colocar em uma
posição mais cômoda agora, sentado em um mocho confortável e com design
anatômico.
Em odontologia, a ergonomia
tem como objetivos racionalizar o trabalho, eliminar manobras não produtivas,
produzir mais e melhor na unidade de tempo, proporcionar maior conforto e
sugurança do paciente ( NARESSI9, 2002 ).
A ergonomia oferece alguns
recursos para a prevenção da LER. Equilibrando as demandas do trabalho com as
capacidades do trabalhador, a ergonomia
pretende maximizar a saúde, a segurança, o conforto, a eficiência, a
produtividade, a qualidade e , conseqüentemente, a confiança e a moral do
indivíduo. A aplicação dos princípios ergonômicos se incia observando o local
de trabalho, verificando como as tarefas são efetuadas, identificando os
fatores de risco de saúde e implementando soluções. (HELFENSTEIN JUNIOR6,1998).
KHALIL7 (1974 ),
na conclusão de seu estudo, afirma que a ergonomia é um campo aberto à pesquisa,
e apresenta um tremendo potencial para aumentar a efetividade na odontologia.
POLLACK13 (1996), também concorda que as ações ergonômicas em odontologia tem um
efeito muito positivo, proporcionando uma melhor qualidade de atendimento, com
um tempo menor, e principalmente sem
estresse.
Além das ações ergonômicas, o profissional,
deve ainda habituar-se a criar uma agenda diária, alternando os procedimentos
de esforço excessivo, como raspagem radicular, por exemplo, com aqueles mais
amenos; e programar pausas de 10 minutos em cada hora trabalhada, podendo neste
período fazer exercícios leves, como a simples flexão e extensão dos dedos das
mãos15.
Ainda como medidas de ordem pessoal,
atividades físicas regulares, como ioga, tai chi chuan, exercícios de
alongamento e aeróbicos, além de ajudarem na manutenção da saúde e
condicionamento físico, ajudam a prevenir a ocorrência de LER.
Conclusão
Pelo que foi exposto, podemos concluir que,
devido às características intrínsecas da prática odontológica, onde o
profissional utiliza como rotina de trabalho os membros superiores, quase
sempre com repetitividade de um mesmo padrão de movimento, além do uso
excessivo de força, este mesmo profissional, por isso está propenso ao
desenvolvimento das LER. Portanto, faz-se necessário inicialmente a
conscientização de toda a classe profissional, para posteriormente desenvolver
e implementar medidas de prevenção, visando com isto, proporcionar uma melhor
qualidade de vida e de trabalho.
. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Acesso em : 05, abr. 2003.
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Nov. 1963.
6-HELFENSTEIN JUNIOR, M.
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Paulo: Schering Plough, 1999. 26p.
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15-TAGLIAVINI, R. L.; POI, W. R. Prevenção de doenças ocupacionais em odontologia. São Paulo: Santos, 1998. 105 p.
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